Leonardi, M. et al. (2020)
Endometriose e a pandemia pelo Coronavirus (COVID-19): recomendações clínicas e considerações futuras
Tradução parcial do artigo por Sara Carvalho
Introdução
A pandemia causada pelo COVID-19 levou a uma mudança drástica na prática clínica relativa à saúde da mulher. Também o impacto no acompanhamento a portadoras de endometriose tem sido significativo. A endometriose é definida como uma doença inflamatória, caracterizada pela presença de lesões de tecido semelhante ao endométrio fora da cavidade uterina, e que é associada a dor pélvica e/ou infertilidade (1). Afeta cerca de 10% das mulheres em idade reprodutiva a nível mundial, é diagnosticada através de visualização cirúrgica ou imagiologia radiológica, e é gerida com recurso a tratamentos hormonais ou por via da remoção laparoscópica das lesões (2-4).
Aquando da redação do presente artigo, e seguindo indicações de organizações internacionais da área da Ginecologia, muitos centros suspenderam temporariamente as respetivas consultas externas, os exames imagiológicos de diagnóstico para dor pélvica não-aguda, as cirurgias de endometriose, bem como os tratamentos de fertilidade. Tendo em conta a interrupção do acompanhamento de rotina e havendo ainda incerteza relativamente a quando é que os serviços de saúde poderão voltar a estar disponíveis, é provável que as portadoras de endometriose se sintam vulneráveis e que o stress e a ansiedade daí resultantes possam contribuir para um agravamento dos sintomas.
A pandemia coloca vários desafios importantes aos profissionais de saúde relativamente à melhor forma de prestar os cuidados adequados no contexto destas restrições. Neste documento, apresentamos, por um lado, recomendações clínicas sobre a forma como a endometriose deve ser gerida durante a pandemia por COVID-19 e, por outro, algumas considerações futuras (Tabela 1).
Tabela 1
Deve ser dada atenção aos riscos da pandemia por COVID-19 em pacientes com endometriose
- Redução da qualidade de vida devido:
- A atrasos no diagnóstico e tratamento resultantes:
- Do encerramento de serviços clínicos de cariz ambulatório (consultas, exames de imagiologia, marcações junto de outros profissionais de saúde) e
- Do eventual aumento das listas de espera nos serviços assim que os mesmos sejam retomados.
- Ao elevado nível de incerteza das intervenções cirúrgicas e ligadas à fertilidade.
- A atrasos no diagnóstico e tratamento resultantes:
Opções de tratamento para pacientes com endometriose
- O adiamento de cirurgias planeadas e de tratamentos de fertilidade deverá ter em conta as indicações dos respetivos colégios e sociedades médicas, bem como dos órgãos competentes.
- A atual gestão da doença deverá manter-se se os sintomas forem estáveis. Caso se verifique um agravamento dos sintomas, deverá ser contactado um profissional de saúde para eventuais alterações na medicação.
- As pacientes deverão privilegiar consultas com recurso à telessaúde em detrimento de consultas presenciais.
- As pacientes com dor devido à endometriose poderão ainda considerar o uso de antiinflamatórios não esteróides (NSAIDs em Inglês) ou outra medicação analgésica de venda livre.
- Na ausência de um diagnóstico imagiológico ou cirúrgico, é adequado o recurso à terapia médica empírica com medicação hormonal.
- As pacientes deverão ainda considerar as diversas estratégias complementares e alternativas de gestão da dor, disponíveis através de serviços de telessaúde.
Recurso aos serviços de urgências
- As pacientes deverão recorrer aos serviços de telessaúde o mais possível antes de optarem pelos serviços de urgências.
Considerações futuras relativamente à gestão da endometriose
- O retomar das cirurgias e dos tratamentos de fertilidade deverá seguir orientações dos colégios e sociedades médicas, bem como ser definido pelos órgãos competentes.
- Assim que as cirurgias forem retomadas, deve ser equacionado/a:
- O rastreio pré-operatório à COVID-19
- A adoção de comportamentos adequados no que diz respeito ao uso dos equipamentos de proteção individual
- A libertação mitigada de aerossóis através de alterações das técnicas cirúrgicas
- Os serviços de telessaúde devem ser considerados como um método viável de avaliação da doença, a partir do momento em que houver retoma dos serviços de rotina de cariz ambulatório.
- As estratégias de autogestão da doença devem continuar a ser altamente encorajadas como complemento à gestão tradicional.
- Deve ser implementadas ferramentas de triagem pré-operatórias, incluindo algoritmos clínicos avançados e estratégias imagiológicas, a fim de evitar laparoscopias de diagnóstico, assim como procedimentos cirúrgicos múltiplos/de repetição.
Link para artigo original: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/frph.2020.00005/full